24 de junho de 2008

a meritocracia

"Era mais fácil até que os testes que os professores nos deram ao longo do ano."
DN Online, 23 de Junho de 2008

Como já aqui escrevi, tenho estado envolvido no processo dos exames nacionais como vigilante de provas. Reparei, logo no primeiro exame que vi, incluindo o da disciplina que lecciono, que este ano deve ter sido considerado por esta equipa ministerial o ano das boas estatísticas. A política não é nova e tem sido recorrente neste governo, só continua a surpreender porque agora até os próprios alunos começam a considerar ridícula esta abordagem aos exames. E quando são eles, os mais directos interessados, que estranham, algo está definitivamente podre.
Muitos terão ontem e durante a última semana ficado contentes. O problema é que até foram os alunos mais fracos que rejubilaram. E isto é que não é correcto. Os exames deveriam distinguir os melhores e assim para nada servem. Desculpem. Servem a estatística, que se repararem tem sofrido fantásticas melhorias recentemente.
Esta facilidade é um presente envenenado, que transmite a mensagem do «nacional porreirismo» que, como todos sabemos, tanto contribuiu para o nosso desenvolvimento. Bem sei que é difícil a um governo ter um primeiro que compra uma licenciatura. Bem sei que para a generalidade das pessoas até é giro ser engenheiro sem o ser. Mas quando se fala na necessidade de agarrarmos os melhores é desta forma que o pretendemos fazer?
Quem tem mérito precisa de incentivo e reconhecimento. O que estes exames fizeram foi nivelar os alunos. Quem era aluno de 20 continuará a sê-lo. Quem era de 14, passará a ser de 18 ou 19. A pergunta que cada vez mais ouço os miúdos fazer é então para quê esforçar-me? E com razão. Nada ganham com isso.
Percebo muito bem de que se fala quando se fala em mérito. Não é uma invenção. É uma reivindicação do Iluminismo, consumada na Revolução Francesa. A versão portuguesa é que difere. O mérito cá no burgo é pertencer à família certa. É ter o amigo certo. É estar no sítio certo. É lamber botas no partido certo. Lembrei-me disto porque vi recentemente o Matchpoint. Dirão que o filme até demonstra que isto acontece por todo o lado. E se calhar até é verdade. Mas não tenho de o defender. Muito menos como professor. Há anos que digo que estamos a menosprezar as capacidades de muitos. E tudo para que todos consigam pouco. A tal estatística. Só que isto está a incutir numa geração inteira o sentimento de indiferença.
Perceber que nem todos têm de ser doutores era um passo importante. Mas se calhar o mais premente é validar verdadeiramente aqueles que se distinguem pelas suas capacidades. Se calhar até acabaríamos com o Status Quo dos nossos governantes. Só assim algo pode mudar. Claro que isto é sonhar alto. Mas será mesmo necessário esperar tão pouco?
P.S.- Há bocado ouvi a ministra na Assembleia da República a dizer que não sabe quem faz os exames e não tem qualquer interferência na execução dos mesmos. É obviamente verdade... na terra do nunca. Mas também o aeroporto ia ser na OTA, não é? Jamais, jamais...

2 comentários:

Anónimo disse...

"É uma reivindicação do Iluminismo, consumada na Revolução Francesa."

LOOOOL, continua que a plebe intelectual agradece;)

jorgefm disse...

Vícios de professor de História. O que se pode fazer?