Para os muitos que não percebem o que está em causa na avaliação dos professores, seria bom que lessem este texto. Quando o ano passado fomos confrontados com o modelo proposto afirmámos (e afirmamos!) que ele era inexequível e que ocultava objectivos mais sinistros do que os anunciados. O modelo é burocrático, divisionista e caciquista e beneficia aqueles que se destacam pelo acessório e não pela sua efectiva qualidade como docentes. Privilegia quem muitas flores faz, quem muito recorre às novas tecnologias, ainda que sem nexo e sem objectivo, e institui um clima de servilismo para com os agora orgulhosos professores titulares (embora reconheça que nem todos sentem tal satisfação). Propõe-se a avaliar os resultados, a considerar a progressão dos alunos, sem sequer tentar perceber o que os condicionou. Preocupa-se com o resultado final, que tende, por isso, a ser adulterado, particularmente pelos tais vassalos que nunca vão olhar a meios para obter aquilo que mais lhes interessa: a progressão na carreira.
Estes e outros problemas já conhecíamos. Já era perceptível que com este ministério só convive bem quem a ele se submete, mas agora, finalmente, começa a vir ao de cima o porquê de tudo isto. O ano passado uma parte dos professores foi avaliada através de um processo ainda mais ridículo, o simplificado, bem pior e mais absurdo do que aquele que sempre nos avaliou nas últimas décadas. Foi aplicado sem critério pelas escolas do país, consoante a vontade de quem preside aos Conselhos Executivos. Claro está que os resultados foram dispares, sem nexo e com critérios de desempate baseados mais na «linda cor dos olhos» do avaliado do que na sua competência. Muitos casos houve, como o meu, em que obtivemos a nota máxima da classificação (incluindo na tão falada assiduidade, nem uma falta) e isso traduziu-se no Bom, não sujeito a quotas e a mais trabalhos. Na escola onde trabalhei nem sequer atribuíram outras classificações, alegando que para se conseguir melhor era preciso fazer muito mais que o serviço distribuído com competência (???).
Tudo isto é grave. Tem implicações na vida das pessoas, nem que seja no orgulho e na dignidade profissional. Mas é óbvio que a humilhação não podia ficar por aqui. O ministério propôs que para os concursos do ano que vem a nota obtida o ano passado sirva de desempate na graduação dos professores. Bem sei que a maior parte de vós não percebe como isto funciona, mas o nosso futuro profissional pode ficar definido por um lugar nessa lista de graduação. Pode ser a diferença entre quem tem trabalho e quem vai para o desemprego.
A maior parte de nós não foi avaliado justamente. Cada escola tratou a avaliação como entendeu (tal era o desnorte que ia na 5 de Outubro). E os critérios foram tudo menos objectivos e transparentes. Agora vão pesar no concurso do ano que vem, o primeiro para aceder à carreira nos últimos três anos e único para os próximos quatro. Todos suspeitávamos que o plano fosse este. Faltava a prova. E essa prova é o projecto-lei apresentado aos sindicatos.
Já sei que o país detesta os professores. Já sei que todos vêem na classe uma cambada de preguiçosos. Sobretudo sei que todos julgam que percebem de educação. Embora se esqueçam da que têm de dar aos filhos. Mas se alguém considera que é assim que se escolhem os melhores precisa de rever rapidamente o seu sistema de valores.
Este é um país onde quase todos se sujeitam a quem tem poder, na esperança de levarem alguma migalha. Sim, porque chateados só ficam quando a migalha não lhes cai no colo. Eu não me revejo neste comportamento. Se assim fosse nunca estaria nesta profissão. Não é o que ensino aos meu alunos e não devia ser isto que os pais desejam para os seus filhos. Independentemente do «miopismo» político. Volto a dizer. Triste é o país que assim trata a educação.
1 comentário:
É assim que também me sinto, triste, triste, triste...
Custa ver um sonho ser destroído, ser corrompido por quem nem sequer entende este sonho! Sim, porque sonhei com isto, trabalhei para conquistar este sonho, esforcei-me ao longo de muitos anos e continuo a esforçar para estar numa sala de aula, para deixar em quem me ouve um testemunho, algo que os ajude a crescer, a perceber o que os rodeia... Quem olha para mim, de fora, para os professores em geral, não compreende... Há dedicação diária, há trabalho, há muitas horas de compensação de algo que não trazem de casa e deveriam trazer (de afecto, tantas vezes!!!), há um processo exigente por si só, que só faz bem quem faz por gosto! A essência está no gosto, na vontade, na realização do sonho... E eu ainda estou encantada por este sonho ao ponto de pedir (oxalá alguém ouvisse esta prece...) para não nos tirarem este gosto! Deixem-nos trabalhar com paz, com confiança, em liberdade!
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