Já devia estar habituado, mas não consigo. Todos os anos sou confrontado com uma nova estupidez ditada pelo nosso ministério da educação. Esta que aqui hoje exponho é apenas só mais uma que considero revestir-se de muita gravidade.
O país ficou, como sabemos, contente com as aulas de substituição. Não ligou, obviamente, aos avisos feitos pelos professores de que o modelo adoptado não servia. Não servia e não serve, pois para não pagar a quem é presenteado com estas horas tornou-as em horas não lectivas. Ora numa hora não lectiva realizam-se actividades e elas até estão enumeradas por forma a não permitir que seja efectivamente leccionada uma matéria. Claro que também era impossível, pois o usual é um professor de História ou Português ir substituir um professor de Matemática ou Físico-Química. De outra forma isso custaria mais dinheiro e ensinar nem é bem o que se pretendia com esta medida. Seja como for a verdade é que os pais ficam contentes, os filhos estão fechados numa sala a azucrinar um pobre coitado que nem os conhece em vez de estarem em casa a chatear ou, Deus me livre, estarem a brincar com os colegas.
Não contente com este disparate, e mais uma vez para poupar uns trocos para pagar aos preciosos acessores, esta equipa ministerial tornou as aulas de apoio em horas não lectivas. Ora uma hora não lectiva é uma hora para reuniões ou para serviço na escola. Até uma criança percebe que o apoio é uma hora em que está efectivamente a ter uma aula, onde está a realizar actividades para si direccionadas e sempre com a explicação do professor. Como era de esperar os pais não se importam, por isso os professores que aguentem que o país está em crise.
Ficar por estas incongruências não bastava, porém, e este ano fui confrontado com uma situação para mim nova, mas que infelizmente já dura há uns anos, como vim a descobrir. O ministério da educação num lampejo de generosidade criou a disciplina de Português Língua Não Materna, direccionada para aqueles alunos que não nasceram em Portugal e necessitam de ajuda na sua integração nas actividades escolares e na sua vida social. Até aqui tudo bem, todos estamos de acordo. O problema é que mais uma vez o ministério considera que para o 2º e 3º ciclo do ensino básico esta disciplina com programa próprio e com objectivos distintos do Português curricular é, também ela, uma actividade não lectiva (no secundário não, é uma hora lectiva e, como tal, paga). Mais grave ainda: pode ser leccionada por professores cuja formação de base nem é o Português. É a mesma lógica, estou certo, presente na escolha do ministro da educação; para desempenhar o cargo não pode ser professor. Economista ou sociólogo talvez, mas professor do ensino básico ou secundário nem pensar.
Mais uma vez para poupar tornamos uma boa ideia em completo lixo e desaproveitamos recursos. As instruções são, inclusive, que tal disciplina seja leccionada em simultâneo na aula de Estudo Acompanhado. Vejam bem a situação. Numa turma de trinta o professor tem de desenvolver actividades para 29 alunos e simultaneamente acompanhar um aluno nesta situação, com avaliação própria e desenvolvimento distinto. Isto não é sério!
Infelizmente o que sinto nas escolas é que os professores já estão tão cansados desta falta de responsabilidade que por vezes já nem têm forças para combater isto. Todos os dias surge nova legislação, sempre vinda de um gabinete cuja única preocupação é controlar as despesas. Já ninguém aguenta. Bem sei que o país fica contente de ver professores de «sol a sol» na escola sem pensar nas verdadeiras consequências disso. Eu por mim falo. Preciso de mais tempo para preparar o trabalho com os meus alunos. Neste momento apenas estou enterrado em burocracia desnecessária e sempre com mais alunos, turmas e disciplinas por leccionar. O ministério pode chamar horas não lectivas, mas é certamente porque na sua perspectiva leccionar é um passatempo. Muito mal vai um país que trata a educação desta forma.
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